Autor(es):
Correia, Maria da Luz
Data: 2013
Identificador Persistente: http://hdl.handle.net/1822/29216
Origem: RepositóriUM - Universidade do Minho
Assunto(s): Cultura visual; Recreação; Imagem; Técnica; Estética; Postal ilustrado; Culture visuelle; Récréation; Image; Technique; Esthétique; Carte postale; Visual culture; Recreation; Image; Technique; Aesthetics; Picture postcard
Descrição
Tese doutoramento Ciências da Comunicação (área de especialização em Teoria da Cultura) Departamento de Ciências da Comunicação do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho 2013 Compreendendo a cultura visual contemporânea como resultante do jogo vivido entre as
condições socioeconómicas, os avanços tecnológicos e as operações artísticas ao longo dos últimos
dois séculos, perguntamo-nos: Quais as relações entre a imagem, a palavra e o real daí decorrentes?
Quais as ligações entre os diferentes dispositivos do atual contexto mediático? Como caraterizar a
interação entre as operações artísticas, o comércio social de imagens e os valores fundadores da
instituição estética (arte/não arte, high/low, autor/espetador, original/cópia...)? Esta problemática
encontra uma direção mais precisa na análise das imagens e dos usos do postal ilustrado ao longo das
três primeiras décadas do séc. XX e dos anos 80, 90 e 2000 e ainda na recoleção das apropriações
artísticas deste média, inseparável do advento da fotografia e da instalação de uma rede postal de
comunicação mundial.
Consideramos que, embora o arquivo científico em torno da iconografia coletiva se torne
progressivamente extenso, nomeadamente com a afirmação de domínios epistemológicos que vão da
sociologia do imaginário aos visual cultural studies, para apenas citar dois recentes exemplos, este não
dispensa e pelo contrário torna premente uma persistente revisão da teoria da imagem, que tenha em
conta diferentes aspetos do processo de tecnologização da mesma, iniciado no séc. XIX com a
fotografia e o cinema, e que prossegue hoje com as realidades digitais e os ambientes virtuais da Web
2.0.... A revisão deste trajeto é elaborada no nosso estudo a partir das ideias de recreação e de
remediação. A imagem recreativa corresponde a uma conceção paradoxal da imagem e da técnica
enquanto entidades que seriam, por um lado, vocacionadas para “uma sensibilidade puxada à
manivela”, retomando a expressiva fórmula de Moisés de Lemos Martins (2011), através de formas de
alienação e de automatização, e por outro lado, favoráveis ao exercício da experiência e à afirmação da
condição histórica, através de táticas de reinvenção, de rearranjo e de conserto. A noção de
remediação, terminologia sugerida por Bolter & Grusin (2000) pressupõe um entendimento do
complexo mediático contemporâneo enquanto um todo interdependente, unido por relações de
colaboração e de hibridação não cronológicas, que entra em rutura com o linear esquema sequencial
que distingue novos e velhos média. Uma cultura atravessada por táticas de recreação e de
remediação é ainda, como o entreviu o visionário pensamento de Walter Benjamin (1991, 1992), uma
cultura onde se instabilizaram as fronteiras entre as posições de autor e de espetador, os estatutos de
original e de cópia, de high e de low, categorias artificiais de caráter normativo que se destinariam a
legitimar o discurso da instituição estética, mas que se manteriam ausentes no âmbito da nossa travessia espontânea e quotidiana de polimórficas atmosferas visuais e que seriam, de resto, alvo das
mais heterogéneas derisões artísticas, paradoxalmente hoje assimiladas por essa mesma instituição
estética. O postal ilustrado, outrora protagonista das exposições universais, hoje omnipresente nos
grandes centros policulturais de arte moderna e contemporânea – nas suas lojas, nas suas salas e nos
seus espaços de ócio, como cafetarias, bares e restaurantes – insere-se na nossa problemática de
modo especialmente pertinente: objeto entre a arte e o comércio, com imagens e palavras, veículo da
fotografia e parente próximo do cinema, o postal presta-se tanto à exploração de uma estereotipia dos
afetos como se oferece às artimanhas, aos truques e às montagens dos seus usuários. Não obstante o
mal-estar generalizado que paira sobre as ideias de cultura, de imagem e de arte desde o início do
séc. XX com a crítica às indústrias culturais até à atualidade com os ataques à sociedade do
espetáculo de Guy Debord e à sociedade do simulacro de Jean Baudrillard, propomo-nos seguir a
simples mas trabalhosa máxima proposta por Michel Maffesoli (1998) de “dire oui à la vie”, mapeando
os intervalos de ação, os fragmentos de experiência e os pedaços de história coletados pelos mais
conhecidos e mais anónimos, pelos mais excepcionais e pelos mais banais recreadores da imagem e
refazedores do real. La culture visuelle contemporaine ne peut pas être comprise sans avoir à l’esprit l’enjeu entre
les conditions socio-économiques, les avancées technologiques et les opérations artistiques au cours
des deux derniers siècles. C’est en considérant cet enjeu, qu’on s’interroge: Quels sont les rapports
entre l'image technique, la parole et le réel? Quels sont les liens entre les différents dispositifs qui
composent l’ensemble médiatique actuel? Comment peut-on décrire l'interaction entre les opérations
de l’art, le commerce social des images et les valeurs fondatrices de l’institution esthétique (art / pas
de l'art, haut / bas, auteur / récepteur, original / copie ...)? Ce questionnement prend une direction
plus précise, par le biais de l’étude des images et des usages de la carte postale illustrée au cours des
trois premières décennies du XXème siècle et des années 80, 90 et 2000. Concomitante à l'avènement
de la photographie et à l’émergence d'un réseau postal de communication mondiale, la carte postale
illustrée sera également analysée à partir d’une recollection de ses appropriations artistiques.
Malgré l’étendue de l’archive scientifique dédiée à l'iconographie collective, notamment
concernant des champs épistémologiques tels que la sociologie de l'imaginaire et les visual cultural
studies, pour ne citer que deux exemples récents, il est à notre avis fort nécessaire de relire la théorie
de l'image, tout en tenant compte des différents aspects du processus d’appareillement technique de
l’image, qui s’ébauche au cours du siècle. XIX avec la photographie et le cinéma, et qui se poursuit
aujourd'hui avec les réalités virtuelles et les ambiances numériques de la Web 2.0 ... La présente étude
considère ce trajet à partir de deux notions fondamentales : l’idée de récréation et la conception de
remédiation. L'image récréative traduit la reconnaissance de la nature paradoxale de l’image et de la
technique : celles-ci seraient, d’une part, des entités douées d’”une sensibilité tirée à la manivelle”
(Moisés Martins Lemos , 2011), qui se manifesterait sous les formes de l'aliénation et de
l'automatisation ; d'autre part, l’image et la technique, une fois appropriées par des tactiques de
réinvention, de recomposition et de réparation, deviendraient des instances favorables à l'expérience et
à l'affirmation de notre condition historique. À son tour, la notion de remédiation, terminologie suggérée
par Bolter et Grusin (2000), présuppose une affirmation de l’interdépendance des medias
contemporains ; ceux-ci seraient un ensemble solidaire uni par des liens de collaboration non
chronologiques, contraires au schéma séquentiel qui oppose les nouveaux aux vieux médias. Une
culture traversée par la récréation et la remédiation est également, comme l’a constaté l’oeuvre
visionnaire de Walter Benjamin (1991, 1992), une culture où se troublent les frontières entre les statuts
de l'auteur et du récepteur, de l’originel et de la copie, de l’high et du low, statuts normatifs artificiels destinés à légitimer le discours de l'institution esthétique. Absentes de notre traversée quotidienne et
spontanée de la polymorphie des ambiances visuelles, les dichotomies mentionnées seraient l’objet de
nombreuses dérisions artistiques, aujourd'hui paradoxalement assimilées par l’institution esthétique. La
carte postale, autrefois protagoniste des grandes expositions universelles, et aujourd'hui omniprésente
dans les espaces polyculturelles de l'art moderne et contemporain - dans leurs magasins, leurs salles
d’exposition et leurs aires de loisir tels que les cafés, bars et restaurants -, revêt un intérêt particulier
pour l’approfondissement de ce débat: objet entre l’art et le commerce, avec des images et des mots,
vecteur de diffusion de la photographie et proche du cinéma, la carte postale illustrée se prête tantôt à
l'exploration d'une stéréotypie d’affects tantôt à la concertation d’astuces et de ruses, à
l’expérimentation de truquages et de montages de la part de ses utilisateurs. Nonobstant le malaise
général qui pèse sur les idées de culture, d'art et d'image, depuis le début du XXème siècle avec les
critiques qui visaient les industries culturelles, jusqu’à nos jours avec les attaques contre la société du
spectacle de Guy Debord (2006) et la société du simulacre de Jean Baudrillard (1988), nous acceptons
de suivre la maxime simple mais laborieuse proposée par Michel Maffesoli (1998) de “dire oui à la vie",
en cartographiant les intervalles d'action, les fragments d'expérience et les morceaux d'histoire
collectés par les plus connus et les plus anonymes, les plus rares et les plus banaux recréateurs de
l’image et refaiseurs du réel. Understanding contemporary visual culture as a result of the game between socio-economic
conditions, technological advances and artistic operations over the past two centuries, we ask
ourselves: What are the relationships between image, word and the reality? What are the connections
between different devices of the current media context? and the interaction between operations artistic,
images’ social commerce and the founding values of the aesthetic institution (art / non art, high / low,
author / viewer, original / copy ...)? This broad issue finds a more accurate direction in the analysis of
images and uses of the postcard over the first three decades of the century XX and 80, 90 and 2000
and also in the recollection of this artistic media appropriation, inseparable from the advent of
photography and installation of a network of world postal communication.
We believe that, although the scientific archive about the collective iconography progressively
becomes more extensive, particularly with the affirmation of epistemological fields ranging from
sociology of the imaginary to the visual cultural studies, just to mention two recent examples, this does
not make it unnecessary, on the contrary, it makes it urgent to persistently review the theory of the
image, which takes into account different aspects of the same technologization process, started in the
century XIX with photography and film, and which continues today with the realities of digital and virtual
environments web 2.0 ... The review of this path is drawn in our study with the support of the notions of
recreation and remediation. The recreational image corresponds to a paradoxical conception of image
and technique as entities that would be, on the one hand, aimed at "a sensitivity pulled by the crank,"
retaking the expressive formula of Moisés de Lemos Martins (2011), through forms of alienation and
automation and, on the other hand, the favourable to the exercise of experience and the affirmation of
the historical condition, through reinvention, rearrangement and repair tactics. The notion of
remediation, terminology suggested by Bolter & Grusin (2000), requires an understanding of the
complex contemporary media as an interdependent whole, united by non-chronological relationships of
collaboration and hybridization, which rupture with the linear sequential scheme that distinguishes new
and old media. A culture crossed by recreation and remediation tactics is also, as the visionary thought
of Walter Benjamin (1991, 1992) glimpsed, a culture where the boundaries between the positions of
author and viewer, the status of original and copy and high and low have been weakened, artificial
normative categories that were intended to legitimize the discourse of aesthetic institution, but which
would remain absent within our daily and spontaneous route of polymorphic visual atmospheres and would be, moreover, object of the most heterogeneous artistic derisions, paradoxically today assimilated
by that aesthetics institution. The picture postcard, once the protagonist of universal expositions, today
ubiquitous in major policultural centres of modern and contemporary art - in its stores, in their
classrooms and in their leisure spaces, such as coffee shops, bars and restaurants - fits our problem in
a very particular way: object between art and commerce, with pictures and words, photography vehicle,
close relative of cinema, the postal lends itself both to the exploration of a stereotypy of affects and it
also offers to tricks, the tricks and the assemblies of its users. Nevertheless the general malaise that
hangs over the ideas of culture, art and picture from the beginning of the XX century with the critic to
the cultural industries up to the present day with the attacks to the society of the spectacle of Guy
Debord and the society of the simulacrum of Jean Baudrillard, we propose the following simple and
laborious maximum suggested by Michel Maffesoli (1998), "dire oui à la vie", mapping the intervals of
action, the fragments of experience and the pieces of history collected by the best known and most
anonymous, for the most exceptional and the most banal recreators of the image and the remakers of
the real.