Autor(es):
Leitão, Raquel
Data: 2011
Identificador Persistente: http://hdl.handle.net/1822/12712
Origem: RepositóriUM - Universidade do Minho
Descrição
Tese de doutoramento em Estudos da Criança (área de especialização em Saúde Infantil) A obesidade pediátrica atinge níveis epidémicos na maioria dos países
desenvolvidos e está a aumentar de forma acentuada nos países em transição
nutricional. A investigação longitudinal dos padrões actuais de desenvolvimento da
obesidade durante o crescimento, bem como dos factores associados, é considerada
crucial para melhorar a eficácia da prevenção da obesidade. Em Portugal, os dados
longitudinais focados na transição da infância para a adolescência são escassos e o
índice de massa corporal (IMC), que apresenta limitações em ambos os períodos, tem
sido a medida mais usada para classificar a obesidade. Deste modo, os objectivos do
presente estudo foram (i) estudar os padrões actuais de mudança e de tracking da
obesidade da infância para a adolescência; (ii) avaliar o impacto da utilização de
sistemas distintos de classificação da obesidade sobre as estimativas resultantes (iii)
analisar a associação entre o desenvolvimento da adiposidade e a idade da menarca, e
(iv) identificar hábitos alimentares, padrões de actividade física, comportamento
sedentário e características psicossociais que distingam os adolescentes com diferentes
trajectórias de adiposidade.
Os dados antropométricos foram obtidos longitudinalmente em 288 participantes
do EMCV (Estudo Morfofuncional da Criança Vianense) aos 9 e aos 15 anos de idade.
Calculou-se a percentagem de massa gorda (%MG) derivada das pregas adiposas e o
IMC. A obesidade foi definida através dos valores de corte de 25%MG para rapazes e
30%MG para raparigas, e dos valores de IMC propostos pela International Obesity Task
Force. Com base no estatuto obeso (O) ou não-obeso (NO) em cada momento de
avaliação, identificaram-se quatro trajectórias: “NO-NO”, “O-O”, “O-NO” e “NO-O”.
A idade da menarca <12 anos, 12-13 anos, e >13 anos foi classificada, respectivamente,
como menarca precoce (MP), menarca média (MM) e menarca tardia (MT). As
características de estilo de vida e de foro psicossocial foram recolhidas por questionário.
A prevalência total de obesidade (com base na %MG) foi elevada em ambos os
momentos de avaliação. Contudo, nos rapazes diminuiu de 21,9% para 14,8% (p<0,05)
e nas raparigas aumentou de 14,3% para 19,5%. O tracking da obesidade foi moderado
nos dois sexos (K=0,6; p<0,001). A percentagem de rapazes que reverteu a obesidade
mais do que triplicou a das raparigas (9,7% vs. 3%; p<0,05). A prevalência total da
obesidade baseada na %MG foi mais do que duas vezes superior à obtida pelo IMC aos
9 anos (18,4% vs. 7,6%, p<0,001) e quatro vezes superior aos 15 anos (17,0% vs. 4,2%;
p<0,001). Enquanto a incidência de obesidade no período de 6 anos, baseada no IMC, não diferiu significativamente entre sexos (0,8% vs. 0,6%), a baseada na %MG nas
raparigas mais do que triplicou a dos rapazes (8,3% vs. 2,6%; p<0,05).
A média da idade da menarca foi 12,2 anos, sendo que 26,6% das raparigas
foram classificadas como MP. Comparativamente aos seus pares do grupo MT, as
raparigas do grupo MP mostraram sempre adiposidade mais elevada (p≤0,001) e maior
perímetro da cintura aos 15 anos (p=0,009). A incidência de obesidade (no total de 8
anos) nas raparigas MP foi 24,1% enquanto que a dos seus pares MM+MT foi de 13,8%
(p=0,005).
Nas variáveis de estilo de vida e psicossociais estudadas, as diferenças de género
nos adolescentes que se mantiveram obesos (O-O) foram muito menos evidentes do que
as verificadas nos que nunca apresentaram esta condição (NO-NO). Apesar de não se ter
encontrado uma associação entre a frequência de ingestão de fruta e vegetais e as
trajectórias de adiposidade, no geral, o consumo deste grupo de alimentos foi baixo. As
associações mais consistentes nos modelos de regressão logística foram observadas em
relação à dificuldade em fazer amigos e ao tempo despendido com actividade física. Os
adolescentes que referiram ter dificuldade em fazer amigos tiveram maior probabilidade
de desenvolver obesidade (NO-O) do que os que reportaram ter facilidade (OR=5,33;
p=0,049). Aqueles que referiram despender mais tempo com actividade física tiveram
menor probabilidade de desenvolver obesidade (OR=0,09; p=0,022) e maior
probabilidade de reverter a condição (O-NO) (OR=6,73; p=0,016).
Em conclusão, a discrepância entre as estimativas da obesidade (taxas de
prevalência e incidência) baseadas em métodos distintos questiona o conhecimento da
dimensão real do problema nos jovens. Enquanto nos rapazes o risco de
desenvolvimento de obesidade parece ser mais elevado durante a infância, nas raparigas
este risco parece persistir na adolescência. Os resultados sugerem que a menarca
precoce pode estar associada ao desenvolvimento da obesidade durante a adolescência.
Contudo, a “programação” desta vulnerabilidade poderá ter início antes da menarca,
dado que o grupo MP já apresentava maior adiposidade do que o grupo MT aos 7 anos
de idade. Apesar das mudanças fisiológicas na %MG poderem ter contribuído para a
maior vulnerabilidade de desenvolvimento de obesidade durante a adolescência nas
raparigas, oferecendo alguma protecção aos rapazes, os resultados sublinham a
relevância da actividade física para a prevenção e tratamento da obesidade. Estratégias
integradas com foco na actividade física poderão ser a chave para combater eficazmente
a obesidade e também para favorecer o bem-estar psicossocial dos adolescentes,
podendo e devendo a escola ter um papel preponderante neste âmbito. Paediatric obesity has reached epidemic levels in most developed countries and
it is increasing markedly in countries undergoing nutritional transition. Longitudinal
analysis of current obesity development patterns during growth, as well as of its
associated factors, is considered crucial to improve the effectiveness of obesity
prevention. In Portugal there is lack of longitudinal data focused on the transition from
childhood to adolescence and body mass index (BMI), which has limitations in both
periods, has been the most common measure used to classify obesity. Thus, the
purposes of this study were (i) to study the current change and tracking patterns of
obesity from late childhood into adolescence; (ii) to assess the impact of using different
classification systems of obesity on the resulting estimates; (iii) to analyse the
association between adiposity development and age at menarche; and (iv) to identify
food habits, physical activity pattern, sedentary behaviour and psychosocial
characteristics that distinguish adolescents with different adiposity development
trajectories.
Anthropometric measurements were longitudinally obtained in 288 subjects
enrolled in the EMCV (Estudo Morfofuncional da Criança Vianense) at age 9 and 15
years. BMI and percentage body fat (%BF) derived from skinfolds were calculated.
Obesity was defined by both the International Obesity Task Force BMI standards and
the cut-offs of 25%BF and 30%BF in boys and girls, respectively. Based on the status
obese (O) or non-obese (NO) at each assessment, four trajectories were identified: “NONO”,
“O-O”, “O-NO”, and “NO-O”. Age at menarche <12yr, 12-13yr, and >13yr was
classified as early menarche (EM), average menarche (AM) and late menarche (LM),
respectively. Lifestyle and psychosocial characteristics were collected by
questionnaires.
The overall prevalence of obesity (%BF-based) was high at both assessment
times. However, in boys it decreased from 21.9% to 14.8% (p<0.05) while in girls it
increased from 14.3% to 19.5%. Obesity tracked moderately in both sexes (K=0.6;
p<0.001). In comparison with girls, the percentage of boys that reversed obesity (O-NO)
was more than three fold higher (9.7% vs. 3%; p<0.05). The prevalence of obesity based
on %BF was more than twice higher than that obtained by BMI at age 9 (18.4% vs.
7.6%, respectively; p<0.001) and four-fold higher at age 15 (17.0% vs. 4.2%; p<0.001).
While there was no significant difference in the 6-year incidence of obesity based on BMI between sexes (0.8% vs. 0.6%), the incidence of obesity based on %BF was more
than three fold higher in girls than in boys (8.3% vs. 2.6%; p<0.05).
Mean menarcheal age was 12.2yr, with 26.6% of girls classified as EM.
Compared with their LM peers, EM girls were always fatter (p≤0.001) and had higher
waist circumference at age 15 (p=0.009). The 8yr-incidence of obesity in EM girls was
24.1% while in the AM plus LM group it was 13.8% (p=0.005).
For the lifestyle and psychosocial studied variables, gender differences were
much less evident among adolescents who remained obese (O-O) than in those who
were never obese (NO-NO). Although no association between frequency of fruit and
vegetable intake and adiposity trajectories was found, the overall consumption of this
food group was low.
The most consistent associations in the regression models were found for
difficulty of finding new friends and for time spent with physical activity. Adolescents
who reported finding it difficult to make friends were more likely to develop obesity
(NO-O) than those reporting it easy (OR=5.33; p=0.049). Those who spent more time
being physically active were less likely to develop obesity (OR=0.09; p=0.022) and
were more likely to reverse obesity (O-NO) (OR=6.73; p=0.016).
In conclusion, the discrepancy observed between obesity estimates (prevalence
and incidence rates) from different methods raises the question whether the real
dimension of the problem is known in young people. While in boys the risk of
becoming obese seems to be higher during childhood, in girls this risk seems to persist
in adolescence. The results suggest that early menarche might be associated with the
development of obesity during adolescence. However, this vulnerability may start to be
programmed before menarche as girls with precocious menarche were already fatter
than their late maturing peers at age 7. Although the physiological changes in %BF may
have contributed to an increased vulnerability for the development of obesity in girls
during adolescence, while offering some protection in boys, the results underline the
relevance of physical activity for both the prevention and treatment of obesity.
Integrated strategies focused on physical activity might be the key to effectively fight
against obesity and also to foresting adolescents’ psychosocial well-being. Schools can
and should have a leading role in this area.