Author(s):
Borges, Anabela Portela
Date: 2013
Persistent ID: http://hdl.handle.net/10348/3162
Origin: Repositório da UTAD
Subject(s): Bactérias patogénicas; Citotoxicidade; Fitoquímicos; Fenólicos; Inibição do quorum sensing; Mecanismos de ação; Prevenção e controle de biofilmes; Produtos de hidrólise dos glucosinolatos; Antimicrobiana; 579.84(043)
Description
A resistência antimicrobiana constitui uma das mais graves ameaças à saúde pública. Infecções por bactérias resistentes são actualmente muito comuns, e alguns agentes patogénicos têm mesmo desenvolvido resistência a várias classes de antibióticos. A perda de antimicrobianos eficazes tem diminuído a capacidade de combater as doenças infecciosas. Um factor importante que contribui para o aumento da resistência de muitas bactérias patogénicas, aos antibióticos/sistema imunológico do hospedeiro, é a sua capacidade de formar biofilmes. Estas comunidades bacterianas causam não só graves problemas de saúde mas também grandes perdas económicas. As bactérias associadas a biofilmes apresentam uma tolerância intrínseca aos agentes antimicrobianos, sendo as infecções por biofilmes particularmente difíceis de tratar. Apesar do reconhecimento do papel central que o biofilmes bacterianos têm tido nas infecções, tratamentos eficazes são ainda limitados. Além disso, não existe actualmente em uso clínico nenhuma composto com actividade contra biofilmes. Isto deve-se provavelmente ao facto de que os mecanismos que estão envolvidos na formação do biofilme ainda não estão totalmente compreendidos. Assim, tornou-se essencial procurar antimicrobianos alternativos com alvos de acção diferentes e com baixa toxicidade.
Considerando a capacidade demonstrada pelos compostos naturais de plantas para a prevenção de doenças, torna-se fundamental estudar o seu potencial como inibidores de microrganismos patogénicos e seus biofilmes. Dado que certos fenólicos e produtos de hidrólise dos glucosinolatos (GHP) são fitoquímicos biologicamente activos na prevenção de doenças, este trabalho teve como principal objectivo fornecer informação sobre a actividade destes compostos em quatro bactérias com importância clínica (Escherichia coli, Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus e Listeria monocytogenes), em estado planctónico e em biofilme. Foram também estudados os seus mecanismos de acção na célula bacteriana. Além disso, foi avaliada a actividade destes compostos na inibição da adesão, da mobilidade e do quorum sensing (QS).
O estudo da actividade antimicrobiana de onze fitoquímicos pertencentes à classe química dos compostos fenólicos (tirosol – TL; ácido gálico – GA; ácido caféico – CA; ácido ferúlico – FA; ácido clorogénico – CHL; oleuropeína glicosídeo – OG; floridzina – PHL e (-) epicatequina – EPI) e GHP (alilisotiocianato – AITC; benzilisotiocianato – BITC e 2-feniletilisotiocianato – PEITC) foi efectuado pelo teste de difusão em disco. A avaliação da actividade antimicrobiana da combinação do antibiótico, estreptomicina, com os fitoquímicos também foi realizada. Este trabalho permitiu a identificação de diferentes compostos (GA, FA, AITC e PEITC) com acção antimicrobiana, incluindo capacidade de potencializar o efeito da estreptomicina, os quais foram seleccionados para os estudos posteriores.
O mecanismo de acção dos fitoquímicos seleccionados foi avaliado pela determinação da concentração mínima inibitória (MIC), concentração mínima bactericida (MBC), captação de iodeto de propídio (PI), libertação de potássio (K+), e caracterização físico-química das propriedades da superfície bacteriana através da medição do potencial zeta e ângulos de contacto. Verificou-se que ambos os fenólicos (GA e FA) e isotiocianatos – ITCs (AITC e PEITC) alteraram as propriedades das células bacterianas, diminuindo a sua carga superficial negativa e comprometendo a integridade da membrana citoplasmática com a consequente captação de PI e libertação de constituintes intracelulares essenciais (K+). Foi possível observar que a percentagem de células com a membrana danificada (captação de PI) aumentou consideravelmente com a concentração de fitoquímico. A libertação de K+ foi particularmente significativa para as estirpes E. coli e P. aeruginosa após exposição aos fenólicos. Contrariamente, com os ITCs observou-se maior libertação de K+ pelas estirpes S. aureus e L. monocytogenes, do que pelas bactérias Gram-negativas. A mesma tendência foi observada para a alteração da carga superficial. A hidrofobicidade da superfície bacteriana também foi modificada, principalmente com o GA e o PEITC. No entanto, o carácter físico-químico das membranas bacterianas não foi especificamente alterado com a aplicação do fitoquímico.
O efeito do GA, FA, AITC e do PEITC em biofilmes (prevenção e controlo) de E. coli, P. aeruginosa, S. aureus e L. monocytogenes foi avaliado pela quantificação da massa (coloração com violeta de cristal) e da actividade metabólica das células (ensaio com a resazurina) do biofilme, através da realização de um ensaio em microplacas. Os resultados foram apresentados como percentagem de remoção e inactivação das células do biofilme. De referir que E. coli e P. aeruginosa foram consideradas fortes produtores de biofilmes, L. monocytogenes apresentou moderada capacidade de formação de biofilme e S. aureus foi considerado fraco produtor de biofilme. Os compostos testados apresentaram elevado potencial para prevenir e controlar os biofilmes das bactérias em estudo. Globalmente, o GA e o AITC foram mais eficazes na prevenção de biofilme (remoção/inactivação), do que o FA e o PEITC, para todas as bactérias testadas. Os compostos avaliados mostraram ainda maior potencial para reduzir a massa dos biofilmes formados pelas bactérias Gram-negativas em comparação com as Gram-positivas. Reduções de viabilidade superiores a 70% e 60% foram observadas com os ácidos fenólicos e ITCs, respectivamente, para todos os biofilmes testados. O GA e os ITCs (excepto para S. aureus cultivado na presença do AITC e para E. coli e L. monocytogenes cultivadas na presença do PEITC) tiveram uma melhor acção na prevenção do que no controlo dos biofilmes.
A interferência dos fitoquímicos com o potencial de adesão das bactérias ao poliestireno (PS), foi estudada pela avaliação da energia livre de adesão de acordo com a abordagem termodinâmica. Os resultados obtidos demonstraram que a adesão das bactérias foi menos favorável após exposição ao GA (P. aeruginosa, S. aureus e L. monocytogenes), FA(P. aeruginosa e S. aureus), AITC (E. coli e P. aeruginosa) e ao PEITC (P. aeruginosa). A relação entre os parâmetros físico-químicos da superfície das células bacterianas e a sua adesão ao PS também foi estudada, tendo-se verificado que a adesão bacteriana não é influenciada apenas pelas propriedades físico-químicas da superfície, e que outros factores tais como a presença de apêndices celulares e a produção de substâncias poliméricas extracelulares (EPS) podem também ter um papel importante. A relação entre a adesão das bactérias ao PS e a formação de biofilme foi caracterizada. Uma falta de concordância entre estes dois fenómenos foi observada, o que indica que a adesão inicial por si só não permite prever a capacidade das bactérias testadas para formar biofilmes maduros. Deste modo, estudos de inibição da mobilidade com os ácidos fenólicos e ITCs foram também realizados, tendo os resultados mostrado que estes compostos, particularmente o FA e o PEITC tiveram capacidade para reduzir a mobilidade bacteriana.
O efeito dos fitoquímicos inicialmente testados foi avaliado na inibição do quorum sensing (QSI). Para tal, um ensaio de difusão em disco com base na inibição do pigmento do biossensor Chromobacterium violaceum foi realizado. Além disso, os seus efeitos sobre a modulação da actividade e síntese das N-acil homoserina lactonas (AHLs) foram também avaliados. Os resultados obtidos demonstraram o potencial do AITC, BITC e do PEITC para QSI através da modulação da actividade e síntese das AHLs. Ensaios de citotoxicidade com uma linha celular de fibroblastos de pulmão de rato foram realizados, com o objectivo de avaliar a potencial aplicação dos fitoquímicos estudados como antimicrobianos. Os resultados obtidos demonstraram que o FA, a PHL e a EPI apresentam baixa citotoxicidade, o que sugere a sua potencial aplicação terapêutica.
Em conclusão, o trabalho desenvolvido nesta tese mostra que os fitoquímicos são aparentemente, uma alternativa atractiva e/ou complemento aos antimicrobianos convencionais no tratamento de infecções. O GA, FA, AITC e o PEITC parecem ser fitoquímicos promissores para o tratamento antimicrobiano, uma vez que estes compostos foram eficazes a inibir o crescimento de bactérias Gram-negativas e -positivas em estado planctónico e em biofilme. Os ITCs parecem ser também atenuadores de virulência interessantes, devido ao seu potencial para QSI. No entanto, é fundamental ter prudência na aplicação terapêutica destes compostos, devido às doses elevadas que são necessárias para obter efeitos antimicrobianos significativos e também devido à alta citotoxicidade apresentada por alguns dos compostos estudados (ITCs e o GA). Deste modo, são necessário mais estudos com base na modificação estrutural e síntese de novos produtos utilizando estes compostos como base. Antimicrobial resistance is one of the most serious public health threats. Infections from resistant bacteria are now too common, and some pathogens have even become resistant to multiple classes of antibiotics. The loss of effective antimicrobials has decreased the ability to fight infectious diseases. A significant factor contributing to the increase antibiotic/host immune resistance of many pathogenic bacteria is their ability to form biofilms. These bacterial communities pose a critical problem in everyday life, causing many economic and health problems. The intrinsic tolerance of biofilm-associated bacteria towards antimicrobial agents makes biofilm-linked infections particularly recalcitrant to treatment. Despite the central role that bacterial biofilms play in infection, effective treatments are still limited. In addition, there is currently no antibiofilm drug in clinical use. This is probably due to the fact that the mechanisms that underline biofilm formation are not completely understood. Hence, it has become imperative to search for alternative antimicrobials with nonconventional targets and less toxic.
Considering the potential of the natural compounds from plants in disease prevention, it is crucial to study their potential as inhibitors of pathogenic microorganisms and their biofilms. Because certain phenolics and glucosinolates hydrolysis products (GHP) are biologically active phytochemicals in preventing diseases, the main goal of this work was to provide information about the antimicrobial activity of these compounds against four bacteria with clinical importance (Escherichia coli, Pseudomonas aeruginosa, Staphylococcus aureus and Listeria monocytogenes), in planktonic and sessile states. It was also intended to elucidate their mechanisms of action in bacterial cells. Moreover, its effects on the inhibition of adhesion, motility and quorum sensing (QS) were also studied.
The study of antimicrobial activity of eleven phytochemicals belonging to the chemical class of phenolics (tyrosol – TL; gallic acid – GA; caffeic acid – CA; ferulic acid – FA; chlorogenic acid – CHL; oleuropein glucoside – OG; phloridzin – PHL and (-) epicatechin – EPI) and GHP (allylisothiocyanate – AITC; benzylisothiocyanate – BITC and 2-phenylethylisothiocyanate – PEITC), was evaluated by disc diffusion assay. The evaluation of the antimicrobial activity of dual combination of streptomycin antibiotic with phytochemicals was also performed. This work allowed the identification of different compounds (GA, FA, AITC, and PEITC) with antimicrobial action including the capability to potentiate antibiotic effects, which were selected for the subsequent studies.
The mechanism of action of selected phytochemicals was assessed by determination of minimum inhibitory concentration (MIC), minimum bactericidal concentration (MBC), propidium iodide (PI) uptake, potassium (K+) release, and physicochemical characterization of bacterial surface properties by zeta potential and contact angle measurements. Both phenolic acids (GA and FA) and isothiocyanates – ITCs (AITC and PEITC) changed the membrane properties of the bacterial cells decreasing their negative surface charge and compromising the integrity of the cytoplasmatic membrane with consequent PI uptake and leakage of essential intracellular constituents (K+). It was possible to observe that the percentage of cells with damaged membrane (PI uptake) increased considerably with phytochemical concentration. The release of K+ was particularly significant for E. coli and P. aeruginosa with phenolic compounds. Instead with ITCs, K+ release by S. aureus and L. monocytogenes was considerably higher than for the Gram-negative bacteria. The same behavior was observed for the surface charge. The surface hydrophobicity was also altered particularly with GA and PEITC. The physicochemical character of bacterial membranes was non-specifically altered with phytochemical application.
Biofilm studies (prevention and control) were performed using a microtiter plate assay and the effect of GA, FA, AITC and PEITC in E. coli, P. aeruginosa, S. aureus and L. monocytogenes was assessed by biofilm mass (crystal violet staining) and biofilm metabolic activity (alamar blue assay) quantification. The results were presented as percentages of biofilm removal and inactivation. E. coli and P. aeruginosa were considered strong biofilm producers. L. monocytogenes presented moderate biofilm formation ability, and S. aureus was considered weak biofilm producer. The compounds assayed showed high potential to prevent and control the biofilms of the tested bacteria. In general, GA and AITC were more effective in biofilm prevention (removal/inactivation) than the FA and PEITC for all the bacteria tested. The compounds tested showed a higher potential to reduce the mass of biofilms formed by the Gram-negative bacteria comparatively to those Gram-positive. In terms of viability, phenolic acids and ITCs promoted reductions higher than 70% and 60%, respectively, for all the biofilms tested. Biofilm prevention with GA and ITCs (except for S. aureus grown in the presence of AITC and for E. coli and L. monocytogenes grown in the presence of PEITC) occurred at higher levels than the control.
The interference of phytochemicals with adhesion potential of bacteria to polystyrene (PS) was studied by means of free energy of adhesion according to thermodynamic approach. The results showed that adhesion was less favorable when the bacteria were exposed to GA (P. aeruginosa, S. aureus and L. monocytogenes), FA (P. aeruginosa and S. aureus), AITC (E. coli and P. aeruginosa) and PEITC (P. aeruginosa). The relationship between physicochemical surface parameters and adhesion of bacterial cells to PS was also studied, suggesting that bacterial adhesion is not only influenced by the surface physicochemical properties, and that other events such as the presence of cellular appendages and the production of extracellular polymeric substances (EPS) may play a significant role. Moreover, the relationship between adhesion of bacteria to PS and biofilm formation was characterized. A lack of agreement between these two phenomena was observed, indicating that only initial adhesion did not predict the ability of the tested bacteria to form mature biofilms. Thus, studies of motility inhibition with phenolic acids and ITCs were also performed and the results showed that those phytochemicals, particularly FA and PEITC, had capability to promote a decrease in bacterial motilities.
The effect of phytochemicals initially screened was evaluated in quorum sensing inhibition (QSI). For this a disc diffusion assay based on the pigment inhibition of biosensor strain Chromobacterium violaceum was assayed. Besides, their effects were analyzed on the modulation of N-acyl homoserine lactones (AHLs) activity and synthesis. The results obtained demonstrated that AITC, BITC and PEITC had potential for QSI by modulation of AHLs activity and synthesis. Cytotoxicity assays with a mouse lung fibroblast cell line were also performed in order to ascertain the potential use of phytochemicals studied as safe antimicrobials. The results demonstrated low cytotoxic effects of FA, PHL and EPI, suggesting their potential therapeutic application.
In conclusion, the work developed in this thesis clearly reveals that phytochemicals are apparently an attractive alternative and/or complement to conventional antimicrobials in the treatment of infections. GA, FA, AITC and PEITC seem to be a promising phytochemicals to antimicrobial therapy against the bacteria tested, since these compounds were efficient in inhibit the growth of Gram-negative and -positive bacteria in both planktonic and sessile states. In addition, ITCs seem to be also interesting virulence attenuators, due to its potential for QSI. However, careful management in therapeutic use is needed with these compounds due to high doses required to promote significant antimicrobial effects. Besides, ITCs and GA showed high cytotoxicity. Therefore, more studies based on the structural modification and synthesis of new products using these compounds as scaffolds is needed. Tese de Doutoramento em Ciências Químicas e Biológicas