Autor(es):
Ferreira, Ana Rita dos Anjos Maia, 1984-
Data: 2011
Identificador Persistente: http://hdl.handle.net/10451/4927
Origem: Repositório da Universidade de Lisboa
Assunto(s): Águia de Bonelli; Nidificação; Selecção de habitat; Portugal; Teses de mestrado - 2011
Descrição
Tese de mestrado. Biologia (Biologia da Conservação). Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2011 A nidificação arborícola é uma estratégia reprodutora pouco comum nas populações europeias de águia de Bonelli (Aquila fasciata). A selecção do habitat de nidificação desta espécie em meio florestal é pouco conhecida, tendo sido apenas divulgado um estudo sobre a nidificação da espécie em pinheiro da Calabria (Pinus brutia) no Chipre. Desta forma, o presente estudo pretendeu identificar as características das árvores mais relevantes na escolha do local de nidificação pela águia de Bonelli e determinar a influência das variáveis do micro habitat na ocupação dos ninhos e no sucesso reprodutor. Os resultados permitem melhorar o conhecimento sobre os requisitos de habitat desta espécie e construir uma ferramenta de conservação, que serve de base à definição de medidas de conservação específicas. O estudo foi efectuado em 32 casais arborícolas residentes na região montanhosa do Sudoeste de Portugal, que se distribuem desde a Serra do Cercal (Baixo Alentejo) até à Serra do Caldeirão (Algarve). Apesar da espécie apresentar estatuto de conservação Em perigo em Portugal, a população do Sudoeste apresenta características genéticas, ecológicas e comportamentais singulares, que a tornam na única população arborícola de crescimento rápido na Europa e, particularmente, na região do Mediterrâneo. A recolha das variáveis relacionadas com as características das árvores de nidificação, dos ninhos e dos locais de nidificação foi efectuada em 52 árvores-ninho (1 a 2 por cada território) e 78 árvores-aleatórias (1 a 4 por território) entre Setembro de 2007 e Outubro de 2008, mas as medições foram interrompidas durante o período de reprodução das águias para evitar a perturbação. Posteriormente, utilizaram-se Modelos Lineares Mistos Generalizados (MLMG) para analisar os factores determinantes da selecção da árvore de nidificação e Modelos Lineares Generalizados (MLG) para aferir a influência das variáveis de micro habitat na ocupação dos ninhos e no sucesso reprodutor. A maioria dos ninhos em estudo encontrava-se em eucalipto-comum (Eucalyptus globulus), mas também foram considerados ninhos em pinheiro-bravo (Pinus pinaster), pinheiro de Monterey (Pinus radiata), sobreiro (Quercus suber) e eucalipto-negro (Eucalyptus camaldulensis). Destaca-se a ocorrência excepcional de um ninho em eucalipto de produção. Estas espécies de árvores representam o total de espécies com nidificação conhecida de águia de Bonelli no Sudoeste serrano. Os ninhos considerados encontram-se preferencialmente em árvores dominantes e saudáveis e, em média, a 14,9 ± 5,7 m (5,5 – 31,0 m) de altura. As árvores dos ninhos apresentam perímetro médio à altura do peito (PAP) de 2,2 ± 0,8 m (0,94 – 4,10 m) e altura média de 23,9 ± 7,6 m (12 – 44 m). Todos estes valores médios são particularmente mais elevados para os eucaliptos-comuns que suportam ninhos (PAP 2,7 ± 0,7 m, altura árvore 30,0 ± 6,8 m e altura do ninho 18,9 ± 5,5 m). Na sua maioria, as árvores de nidificação localizam-se em encostas de elevado declive, com exposição N/NE, mas os ninhos em eucalipto localizam-se maioritariamente em bosquetes ao longo das linhas de água no fundo dos barrancos. As áreas de nidificação estão incluídas ou têm como vizinhança florestas de sobreiro ou montados abandonados, pinhais-bravos, pinhais de Monterey ou eucaliptais de produção, contudo, por vezes a nidificação ocorre em árvores isoladas rodeadas por matos. No que se refere ao habitat circundante ao ninho num raio de 25 m, a densidade arbórea é muito variável mas a cobertura vegetal é elevada. Os matos são maioritariamente mistos, mas os matos dominados por estevas (Cistus spp.) e os matagais altos de medronheiro (Arbutus unedo) e urze-branca (Erica arborea) também ocorrem em redor dos ninhos. A distância média aos factores de perturbação considerados (casas habitadas, estradas, linhas de transporte de energia, etc.) é de 2,3 km. Através da comparação das características das árvores-ninho com as características das árvores-aleatórias, concluiu-se que o PAP é uma característica importante na escolha da árvore de nidificação pelas águias, para todos os grupos de espécies arbóreas considerados na análise (sobreiros, pinheiros – P. pinaster/P. radiata, e eucaliptos – E. globulus/E. camaldulensis). A altura apenas é relevante na escolha dos sobreiros como árvore de nidificação. Os ninhos de águia de Bonelli são estruturas grandes e pesadas, pelo que é necessária uma plataforma sólida e estável, formada por ramos robustos e pouco flexíveis, que só as árvores de PAP mais elevado poderão fornecer. Os resultados obtidos revelam ainda que a ocupação dos ninhos é influenciada positivamente por algumas características do microhabitat: a presença de matos mistos e matos dominados por estevas (Cistus spp.), o declive da encosta, a percentagem de cobertura da vegetação entre os 4 e os 8 m de altura, o PAP e a presença de eucaliptos (Eucalyptus globulus/Eucalyptus camaldulensis). No entanto, a maior presença de matos altos de medronheiro (Arbutus unedo) e urze-branca (Erica arborea) e a menor cobertura da vegetação entre 1 e 4 m de altura, bem como a menor distancia ao caminho mais próximo, são as únicas variáveis que influenciam significativamente o sucesso reprodutor. A maioria das variáveis que influencia positivamente os parâmetros parece reflectir o reduzido nível de perturbação das áreas de nidificação, pois a maior cobertura por vegetação aumenta a protecção do ninho, o maior declive aumenta a inacessibilidade do local e a presença de matos altos de medronheiro e urze-branca está relacionada com as duas questões. Alguns dos resultados obtidos não eram esperados e podem estar relacionados com artefactos estatísticos e com a forma de aplicação do método de definição da variável. Conclui-se que a águia de Bonelli selecciona árvores com um PAP elevado para construir o ninho e que ocupa preferencialmente árvores de grande porte localizadas em zonas de declive acentuado e com elevada cobertura por vegetação. Contudo, apenas uma das variáveis com influência na ocupação dos ninhos parece ter influência também na reprodução (presença de matos mistos). Este resultado evidencia uma provável influência de outros factores não considerados no presente estudo na produtividade da espécie, quer sejam de origem natural (e.g. pluviosidade elevada e constante durante o período reprodutor) ou humana (e.g. perturbação provocada por desmatações que resultam em alterações significativas do habitat). Destaca-se ainda a crescente importância de espécies exóticas (eucaliptos) em detrimento de uma espécie nativa (sobreiros) na nidificação desta ave de rapina. A utilização de análises estatísticas mais robustas, que melhoram os poderes explicativo e preditivo dos modelos multivariados (<50%), poderão ajudar a clarificar a influência dos factores de micro habitat na selecção da árvore de nidificação, ocupação dos ninhos e sucesso reprodutor. Apesar da população do Sudoeste apresentar actualmente uma tendência populacional positiva, a contínua degradação das árvores de grande porte com potencial para nidificação é uma ameaça importante para a população arborícola de águia de Bonelli em Portugal, particularmente relevante na região serrana do Sudoeste. Esta degradação pode ter efeitos severos na redução do potencial reprodutor da população a médio ou longo prazo. Desta forma, as conclusões obtidas neste estudo, mas também as medidas específicas de PAP que uma árvore deverá cumprir para poder ser utilizada como suporte de nidificação desta espécie, foram utilizadas para definir algumas regras de gestão florestal incluídas no “Manual de Boas Práticas Florestais e Cinegéticas” e do “Plano de Acção para a conservação da população arborícola de águia de Bonelli em Portugal”. Entre elas, destaca-se a preservação dos actuais locais de cria e suportes de nidificação mas também a protecção de árvores de grande porte, localizadas a meia encosta ou no fundo de barrancos com matos desenvolvidos, com PAP mínimo de 1,48 m para sobreiros, 1,01 m para pinheiros e 1,42 m para eucaliptos. Tree-nesting is an uncommon breeding behaviour in Bonelli’s eagle (Aquila fasciata) European populations. As little is known about the nest site selection of this species in forest habitats, 52 nest trees located in Southwest Portugal were studied. Generalized Linear Mixed Models (GLMMs) were used to analyse the determinants of the nest tree selection and General Linear Models (GLMs) to assess the influence of microhabitat variables on nest occupancy and breeding success. By comparing actual nest trees with available randomly selected trees, perimeter at breast height (PBH) was found to be an important feature in the choice of the nest tree by the eagles, independently of the tree species. Regarding microhabitat features, presence of mixed shrubs and shrubs dominated by rockrose, hill slope, vegetation cover at 4 to 8 m height, PBH and eucalyptus trees (E.globulus/E.camaldulensis) influences positively nest occupancy. However, higher presence of taller thicket of strawberry tree (Arbutus unedo) and heath (Erica arborea) and lower vegetation cover at 1 to 4 m height and distance to the nearest unpaved road were the only variables significantly associated with breeding success. Therefore, Bonelli’s eagle occupy preferentially large trees, particularly eucalyptus trees, located at higher slope and surrounded by tall vegetation cover, which reflects the lower disturbance level of the nesting areas. However, productivity is improved when nesting occurs at sites composed by complex and stratified native shrubby understory. Since the current decline of the quality and availability of large potential nest trees is a serious threat to the tree-nesting population of Bonelli’s eagle in the country, PBH measurements obtained in this study were used to define forest management rules, as well as the protection of suitable trees for nesting and breeding sites, that land managers must respect to maintain, create or enhance nesting habitat for this endangered species.