Author(s):
Caiado, Francisco Landeck Moreira Franco
Date: 2011
Persistent ID: http://hdl.handle.net/10451/3740
Origin: Repositório da Universidade de Lisboa
Subject(s): Biologia molecular; Diferenciação celular; Cicatrização de feridas; Integrinas; Tumores; Macrófagos; Teses de doutoramento - 2011
Description
Tese de doutoramento, Biologia (Biologia Molecular), Universidade de Lisboa, Faculdade de Ciências, 2011 Bone marrow (BM)-derived cell populations participate in numerous physiological and
pathological conditions in adult individuals, directly interacting with tissue specific cellular and
extracellular matrix (ECM) components. In particular BM-derived endothelial progenitors
(EPCs) contribute to physiological and pathological new vessel formation, a process termed
posnatal-vasculogenesis. However the molecular mechanisms regulating their contribution are
still lacking. In the present PhD thesis we adressed the role of two major pathways that regulate
embryonic vasculogenesis: the Notch-Delta signalling pathway and Integrin-ECM pathway on
EPC function during wound healing and tumor progression. To address the contribution of
Integrin-ECM interactions to EPC function we tested the effect of the pro-angiogenic fibrin
fragment E (FnE) on EPC vasculogenic properties. Our data shows that FnE potentiates the in
vitro vasculogenic properties of EPCs, increasing their adhesion (via integrin α5β1),
endothelial differentiation and paracrine factor production thus leading to increased in vivo
wound vascularization and healing. Concerning the contribution of the Notch-Delta signalling
pathway we defined that this pathway mediates bidirectional interactions between BM-derived
cells and tissue resident cells during wound healing and tumor progression. In detail we
observed that activation of the Notch pathway on EPCs increases integrin α3β1 expression,
improving EPC adhesion and endothelial differentiation as well as their pro-angiogenic and
wound healing potential in vitro and in vivo. In a tumor setting we observed that EPC-mediated
activation of the Notch signaling on ECs regulates vessel stability by increasing the expression
of basement membrane components as well as endothelial cell-cell junction proteins, thus being
essential for neo-vessel normalization during tumor growth. Further characterization of BMderived
cells recruited to tumor tissues lead us to the identification of BM-derived tumor
associated macrophages (TAMs) that can activate Notch signaling on colon carcinoma cells
inducing tumor epithelial to mesenchymal transition (EMT) thus contributing to tumor
progression and metastisation.
Taken together our results suggests that both Integrin-ECM and Notch-Delta pathways
modulate the properties of BM-derived populations, being essential for the vasculogenic
properties of EPCs and for the tumor promoting functions of TAMs, thus making these
pathways valid targets in both wound healing and tumor progression. O sistema cardiovascular constitui o primeiro sistema de órgãos que se forma durante o
desenvolvimento embrionário dos vertebrados, tendo como principais funções oxigenação e
nutrição de todos os tecidos assim como a remoção de produtos secundários do metabolismo e
regulação térmica via vasoconstrição e dilatação. Os principais componentes do sistema
cardiovascular são o coração, o sangue e os vasos sanguíneos. Por sua vez os vasos sanguíneos
têm como unidade funcional e estrutural a célula endotelial (CE) ao nível da qual são feitas as
trocas celulares, metabólicas e gasosas entre as células de todos os tecidos e o sangue.
A formação de vasos sanguíneos ocorre durante o desenvolvimento embrionário sendo um
processo extremamente complexo que envolve essencialmente dois mecanismos celulares
distintos mas interligados: vasculogénese e angiogénese. A vasculogénese é o processo através
do qual células precursoras endoteliais, denominadas angioblastos, migram, agregam-se e
coalescem formando uma rede primitiva de tubos endoteliais. O subsequente crescimento,
expansão e estabilização dessa rede vascular primitiva ocorre através da proliferação, migração e
consequente ramificação de CE activadas, num processo denominado angiogénese.
Num organismo adulto as CE, assim como os vasos sanguíneos que elas constituem encontramse
num estado não proliferativo, denominado quiescência. No entanto, na presença de estímulos
específicos nomeadamente em situações fisiológicas (cicatrização de feridas, revascularização de
tecidos isquemicos, ovulação, menstruação ou gravidez) ou patológicas (cancro, psoriase, artrite,
retinopatias, aterosclerose ou em feridas com cicatrização atrasada) as CE podem tornar-se
activas e por angiogénese geram novos vasos sanguíneos. No entanto dados recolhidos na ultima
década sugerem que à semelhança do que acontece durante o desenvolvimento embrionário,
também no adulto novos vasos sanguíneos se podem formar por vasculogénese. Efectivamente
foram identificados em indivíduos adultos células denominadas progenitores endoteliais (PE),
que partilham semelhanças com angioblastos embrionários, e que em situações fisiológicas e
patológicas são recrutados e diferenciam-se em CE, que por sua vez incorporam os novos vasos
formados, num processo denominado vasculogénese pós-natal. PE são definidos como células
com origem na medula óssea e que são caracterizados pela expressão de marcadores moleculares
específicos de células estaminais como o CD133, CD34 ou o Sca-1 (em ratinho) assim como
marcadores endoteliais como o VEGFR-2 (receptor 2 do factor de crescimento vascular). Em
resposta a estímulos específicos provenientes de tecidos em remodelação vascular os PE são
mobilizados da medula óssea para a circulação, onde são transportados até atingirem os locais de
remodelação vascular onde abandonam a circulação por extravasão, invadem os tecidos
adjacentes e eventualmente diferenciam-se em CE incorporando os novos vasos formados. O processo de diferenciação endotelial dos PE pode ser dividido em 3 fases essenciais: adesão,
mediada por integrinas, dos PE aos componentes da matriz extracelular, sobrevivência e
proliferação dos PE aderentes em resposta a factores de crescimento e a sinais da matriz
extracelular e finalmente aquisição de marcadores e propriedades endoteliais. Apesar de já ser
conhecida e descrita a contribuição dos PE em diversas condições fisiológicas e patológicas os
mecanismos que regulam a sua diferenciação em CE ainda são desconhecidos.
Assim sendo os objectivos desta tese de doutoramento são a compreensão dos mecanismos
moleculares envolvidos na diferenciação endotelial, em contexto de cicatrização de feridas e de
progressão tumoral, com especial foco em vias que são essenciais para a vasculogénese
embrionária: via de interacção entre integrinas e proteínas da matriz extracelular e via de
sinalização Notch-Delta. Além da compreensão dos mecanismos moleculares que regulam a
diferenciação endotelial em PE também foi feita investigação relativa ao papel da via de
sinalização Notch-Delta na comunicação entre outras populações celulares derivadas da medula
óssea (além dos PE) e células tumorais, durante a progressão tumoral.
No capítulo 3 desta tese de doutoramento abordámos o papel da matriz extracelular provisória
composta essencialmente por fibrina e pelos seus fragmentos de degradação, que se forma
durante a cicatrização de feridas, na função dos PE. Em particular caracterizámos in vitro o papel
do fragmento de degradação da fibrina E (FnE), que tem potentes propriedades pró-angiogénicas,
na diferenciação e nas propriedades vasculogénicas dos PE. De acordo com os nossos resultados
FnE potencia a adesão dos PE, via integrina α5β1, assim como a sua diferenciação endotelial
comparativamente a outros componentes da matriz extracelular. Surpreendentemente
observámos que PE cultivados em FnE produzem níveis mais elevados de factores paracrinos,
nomeadamente de factores pró-angiogénicos e de inúmeras citoquinas. Utilização de meios
condicionados de PE cultivados em diferentes componentes da matriz revelou que os meios
condicionados dos PE na presença de FnE têm propriedades pró angiogénicas assim como
propriedades quimiatractoras de monócitos sanguíneos extremamente elevados
comparativamente às restantes condições. Para validarmos o papel pró-vasculogénico do FnE em
PE in vivo, utilizámos uma matriz sintética enriquecida com FnE (denominada Smart Matrix –
SM) em modelos murinos de cicatrização de feridas. De acordo com os nossos resultados a
adição de SM conjuntamente com PE potenciou significativamente o fecho das feridas, estando
associado a uma maior vascularização da ferida comparativamente com as restantes condições.
Em conclusão os resultados apresentados no capítulo 3 sugerem que FnE tem grandes
propriedades vasculogénicas, pelo que a sua administração sob a forma de uma matriz sintética conjuntamente com PE representa uma possível abordagem terapêutica para potenciar a
cicatrização de feridas quer resultantes de trauma, queimadura ou ulceração crónica resultante de
diabetes, pressão ou estase venosa.
No capítulo 4 investigámos o papel da via de sinalização Notch-Delta na diferenciação
endotelial e nas propriedades vasculogénicas dos PE, num contexto de cicatrização de feridas.
De acordo com os nossos resultados os PE expressam ligandos e receptores da via Notch-Delta e
durante a diferenciação endotelial destas células observámos um aumento na activação da via
Notch-Delta. Curiosamente a inibição farmacológica da via Notch-Delta levou a uma redução
drástica na adesão dos PE a diversos componentes das matriz extracelular assim como a uma
redução significativa do número de CE obtidas no final do ensaio de diferenciação endotelial in
vitro. Mecanisticamente observámos que inibição da via Notch-Delta nos PE conduzia a uma
redução da expressão da integrina α3β1, razão pela qual observámos redução na adesão e
consequentemente na diferenciação dos PE. Adicionalmente verificámos que inibição
farmacológica da via Notch-Delta nos PE reduzia a capacidade destas células induzirem
angiogénese e migração endotelial em ensaios in vitro, sugerindo que a via Notch-Delta é
essencial não so para a adesão e diferenciação endotelial dos PE mas também para as suas
propriedades pró-angiogenicas. Após constatarmos o papel essencial da via Notch-Delta nos PE,
testámos o efeito da inibição desta via em PE em modelos murinos de cicatrização de feridas.
Em confirmação dos resultados in vitro observámos que ratinhos injectados com PE normais têm
um aumento da taxa de cicatrização associado a um aumento do numero de vasos sanguíneos
presentes na ferida. Por outro lado o efeito dos PE na cicatrização e vascularização perde-se
quando a via Notch-Delta é inibida, curiosamente PE com a via Notch-Delta inibida estão
presentes na ferida em frequências menores que os PE normais. Estes dados demonstram que a
activação da via Notch-Delta em PE potencia as suas propriedades vasculogénicas e próangogénicas,
sendo essencial para a sua capacidade de acelerar a cicatrização de feridas em
modelos murinos.
No capitulo 5 abordámos o papel de um dos ligandos da via Notch-Delta expresso em PE, o
Dll4 (Delta-like ligand 4) na angiogénese tumoral. De acordo com os nossos resultados a
expressão de Dll4 em PE é regulada directamente por 2 factores mobilizadores de PE: VEGF
(factor de crescimento vascular) e SDF-1 (factor derivado do estroma de medula óssea). Para
testar o efeito de Dll4 na activação da via Notch-Delta em CE, co-cultivámo PE com diferentes
níveis de expressão de Dll4 conjuntamente com CE e posteriormente analisámos os genes
expressos diferencialmente nas CE consoante os níveis de Dll4 dos PE. De acordo com a nossa análise a activação da via Notch-Delta nas CE via Dll4 expresso pelos PE conduziu ao aumento
da expressão de componentes da matriz extracelular (nomeadamente fibronectina) e de
componentes das adesões endoteliais (ICAM2 e VE-Caderina). In vivo observámos que em
ratinhos transplantados com PE heterozigóticos para Dll4 (Dll4+/-) o crescimento tumoral era
reduzido relativamente a ratinhos transplantados com PE normais, no entanto analise do tecido
tumoral revelou que os tumores dos ratinhos transplantados com PE Dll4+/- tinham maior
densidade vascular, mas menor proliferação, maior frequência de células apoptóticas e áreas de
hipoxia mais extensas relativamente aos tumores crescidos em ratinhos transplantados com PE
normais. Esta observação sugeriu que os vasos tumorais desenvolvidos em ratinhos
transplantados com PE Dll4+/- eram mais instáveis embora existissem em maior numero. De
facto análise histológica revelou que estes vasos apresentam menor expressão de fibronectina e
menor cobertura com pericitos (células vasculares musculares), confirmando que a activação da
via Notch-Delta em CE via Dll4 expresso por PE é essencial para a estabilização da vasculatura
tumoral nascente e consequentemente para o crescimento tumoral. Finalmente para validar o
efeito de Dll4 expresso nos PE na estabilização da vasculatura tumoral transplantámos ratinhos
com PE com sobre-expressão de Dll4 e analisámos a vasculatura tumoral. De facto observámos
que embora o crescimento tumoral não tenha sido alterado, assim como o numero total de vasos
formados, a quantidade de fibronectina assim como o calibre dos vasos tumorais era superior nos
ratinhos transplantados com PE com sobre-expressão de Dll4 do que nos ratinhos transplantados
com PE normais, confirmando que a activação da via Notch-Delta em CE via Dll4 expresso em
PE conduz à estabilização vascular. Concluindo, os dados apresentados no capitulo 5 descrevem
o papel essencial de Dll4 expresso por PE na activação da via Notch-Delta em CE, conduzindo
ao aumento de proteínas da matriz extracelular assim como de componentes das junções
celulares entre células endoteliais essenciais para a estabilização e funcionalidade da vasculatura
tumoral.
Finalmente no capítulo 6 investigámos a contribuição de outras populações celulares derivadas
da medula óssea para a progressão tumoral. Para este efeito utilizámos ratinhos nos quais
transplantámos medula óssea proveniente de ratinhos actina-GFP, pelo que obtivemos ratinhos
nos quais todas as células na medula expressavam GFP. Posteriormente inoculámos estes
ratinhos com tumores derivados de linhas celulares isoladas de carcinoma de cólon (HCT15) e
procedemos à analise histológica dos tumores, após estes crescerem durante 1 ou 4 semanas
(tumores precoces e tardios). Análise histológica revelou que em tumores tardios há uma
contribuição significativa de células derivadas da medula óssea (GFP+) e que estas células
expressam essencialmente marcadores mielóides (CD11b). Inesperadamente constatámos que nas regiões tumorais onde as células derivadas da medula óssea se acumulavam, as células
tumorais perdiam a expressão de marcadores epiteliais (nomeadamente a E-Caderina),
adquirindo a expressão de marcadores mesenquimatosos (nomeadamente Vimentina) sugerindo
que estas células tumorais estavam em transição epitelial-mesenquimal (TEM). Para confirmar a
suspeita que células derivadas da medula óssea poderiam estar a induzir TEM em células
tumorais de carcinoma do cólon, procedemos a co-culturas in vitro com células derivadas da
medula associadas ao tumor com células do carcinoma do cólon. Surpreendentemente
verificámos que células derivadas da medula óssea associadas ao tumor tinham a capacidade de
induzir TEM em células tumorais e ainda que essa capacidade dependia da activação da via
Notch-Delta nas células tumorais. Após uma caracterização detalhada da população de células
derivadas da medula associadas ao tumor capazes de induzir TEM nas células tumorais,
definimos esta população como sendo constituída por macrófagos associados a tumor ou MAT
(CD11b+ F4/80+) que expressava o ligando da via Notch Jagged-2. Experiências de co-cultura
in vitro desta população com células tumorais confirmaram que esta população consegue via
Jagged-2 induzir a activação da via Notch-Delta promovendo TEM nas células tumorais sendo
essencial para a progressão tumoral. Em conjunto os dados apresentados no capitulo 6 sugerem
que durante a progressão tumoral, populações de células derivadas da medula podem de facto
modular propriedades das células tumorais induzindo TEM e consequentemente induzindo um
fenotipo mais invasivo e potencialmente mais metastático nos tumores primários.
Em conclusão, o trabalho realizado neste projecto de doutoramento permitiu atribuir à via Notch-
Delta e também as interacções entre integrinas e proteínas da matrix extracelular um papel
essencial na comunicação entre populações celulares derivadas da medula óssea, em particular
PE e MAT, e componentes celulares e da matrix extracelular presentes durante a cicatrização de
feridas ou durante a progressão tumoral, sugerindo assim o uso destas vias e destas populações
como potenciais alvos terapêuticos.