Author(s):
Lavrado, João Paulo Martins Ferreira, 1978-
Date: 2010
Persistent ID: http://hdl.handle.net/10451/2475
Origin: Repositório da Universidade de Lisboa
Subject(s): Química farmacêutica; ADN
Description
Tese de doutoramento, Farmácia (Química Farmacêutica e Terapêutica), Universidade de Lisboa, Faculdade de Farmácia, 2010 Malaria is one of the most widespread infectious diseases of our time. The global malaria map
has been shrinking over the past 60 years, but today more people are at risk of suffering from malaria
than any other time in history. In the past few years malaria has once again attracted more attention,
partly because it is recognized that malaria spread in sub-Saharan Africa has increased in the recent
years, mainly due to the development of drug resistances.
Cryptolepine (1), is an indoloquinoline alkaloid, extracted from the West African climbing shrub
Cryptolepis sanguinolenta (Lindl.) Schltr, a traditional herb used in folk medicine for the treatment of
malaria. Several authors hypothesized that the mechanism of action of cryptolepine could be by
inhibition of haemozoin formation in the digestive vacuole (DV) of the parasite, however in a
microscopic fluorescence study, the indoloquinoline chromophore, was suggested to accumulate into
specific parasite structures that could correspond to the parasite nuclei, and thus justifying its activity
due to cytotoxic effects on DNA and topoisomerase II activity.
Cryptolepine derivatives (3) have been synthesized through the incorporation of basic side-chains
in the C-11 position of the 10H-indolo[3,2-b]quinoline scaffold and evaluated for their antiplasmodial
and cytotoxicity properties. The derivative containing a conformationally restricted piperidine sidechain
(3n) presented IC50 values of 23-44 nM against chloroquine resistant strains and a selectivity
index value of ca 1400, i.e. a 1000-fold improvement in selectivity when compared with 1. The
introduced side chains are weakly basic, with pKa values in the terminal amine functionality ranging
from 5.2 to 12.5, and are predicted to promote accumulation inside the DV to an extent similar to that of
chloroquine. All compounds within this series showed the ability to interact with monomeric haematin
(FPIX-OH), with a stoichiometry of 1:1 (3:FPIX-OH) and with association constants (Kass) values
between 0.062 and 0.41 x106 M-1, comparable to chloroquine (Kass = 0.085 x106 M-1). The complex
stabilization is assured by π-π stacking interactions modulated by the aromatic core, and H-bond
between the terminal amine side chain and haematin carboxylate anions, thus capable to inhibit
haemozoin formation in DV. However, localization studies of compound 3n inside parasite blood stages
suggest an additional mechanism of action, like interactions with DNA, besides inhibition of haemozoin
crystal growth. Cryptolepine derivatives (3) bind strongly to double-stranded d(GATCCTAGGATC)2
oligonucleotide with association constants ranging from 105 M-1 to 107 M-1. Furthermore, molecular
docking simulations showed that, in contrast with 1, compounds 3 are predicted to not intercalate into
DNA double helix, binding essentially to single- and double-stranded DNA, with a stoichiometry of 2:1
(3:DNA), through electrostatic and H-bonding interaction involving charged nitrogens.
In order to explore the indolo[3,2-b]quinolin-11-one (quindolone) scaffold (4), and get new
antimalarial chemotypes, we decided to synthesize a series of quindolones derivatives (5), targeting
malaria parasite digestive vacuole and haeme detoxification pathway, through the introduction of N,N diethylethanamine in the indolo[3,2-b]quinoline aromatic nucleus (N5,N10-alkylation). This reaction
gave N,O- (94), N,N- (5) and O-(95) alkylated products containing two or one basic side-chains, which
were evaluated for antiplasmodial activity against chloroquine-resistant P. falciparum W2 strain and
cytotoxicity for HepG2 A16 hepatic cells. By incorporating alkylamine side chains and chlorine atoms
in the quindolone nucleus we transformed the inactive tetracyclic parent quindolones (4, 91a and 91b)
into moderate or highly active and selective compounds to the resistant P. falciparum W2 strain, with
IC50 ranging from 51 to 2638 nM and with selectivity ratios up to 98. All the quindolone derivatives in
the series showed the ability to complex FPIX-OH (1:1 stoichiometry) with associations constants (Kass)
ranging from 0,074 to 0,14 x106 M-1, being the main intermolecular interactions due to π-π stacking
interactions and H-bond between derivatives and haematin.
Cryptolepine and the new antimalarial chemotype, quindolone, are suitable scaffolds for the
design of active and selective compounds targeting parasite haemozoin detoxification pathway, with
potential for development as antimalarial agents. A malária ou paludismo é uma doença infecciosa provocada por parasitas do género Plasmodium
e transmitida pela picada do mosquito fêmea do género Anopheles. A malária é uma das infecções mais
difundida por todo o mundo. Apesar propagação ter diminuído nos últimos 50 anos, nos dias de hoje há
mais pessoas em risco de contaminação com malária do que em qualquer outra época da história. Em
2008, a malária era endémica em 108 países, contando com cerca de 247 milhões de casos reportados,
3,3 mil milhões de pessoas em risco. Anualmente, entre 1 a 3 milhões de casos culminam em morte, dos
quais, muitos são crianças com idade inferior a 5 anos. A malária é a principal causa de morte infantil
em África, sendo que 60 % dos novos casos registados todos os anos ocorrem na África sub-Sahariana,
onde ocorrem 90 % dos casos fatais de malária. Para além de ser um grave problema de saúde pública, a
malária é também um problema sócio-económico, não só devido ao elevado investimento efectuado na
prevenção e tratamento, mas também devido a custos indirectos resultantes da perda de productividade
que advêm da elevada morbilidade e mortalidade. No entanto, recentemente a malária voltou a chamar a
atenção da comunidade, muito porque foi reconhecido que o número de casos reportados em África tem
aumentado nos últimos anos devido ao aumento de fenómenos de resistência nos parasitas aos fármacos
utilizados para tratamento da infecção.
Apesar da enorme variedade de compostos com actividade antimalárica, a sua eficácia contínua
no entanto a ser reduzida devido aos fenómenos de resistência associados. A cloroquina (2) é uma 4-
amionoquinolina sintetizada em 1934 e tem sido um dos pilares do tratamento da malária nos últimos 60
anos, sendo de consenso geral, que a sua actividade antimalárica se deva à inibição da formação do
cristal de hemozoína no vacúolo digestivo do parasita. No organismo humano, o parasita ingere
hemoglobina e digere-a, libertando os amino ácidos necessários para o seu desenvolvimento, e o heme,
tóxico para o parasita. Este heme é então biocristalizado pelo parasita a hemozoina, um cristal inerte e
não tóxico. A cloroquina, devido às suas propriedades básicas, apresenta a capacidade de se acumular
no interior do vacúolo digestivo acídico e formar complexos estáveis cloroquina:heme, através de
interacções π-π entre os anéis aromáticos, impedindo assim a formação da hemozoina e originando a
morte do parasita. Vários autores referem ainda que a cloroquina apresenta também a capacidade de
complexar com as faces em crescimento do cristal de hemozoina, inibindo assim o processo de
cristalização.
Nos últimos 30 anos, extractos de uma enorme variedade de espécies de plantas, incluindo muitas
utilizadas na medicinal tradicional, têm sido avaliadas in vitro quanto à sua actividade antimalárica. O
alcalóide criptolepina (1), constituinte maioritário da raíz da Cryptolepis sanguinolenta, um arbusto
trepador africano normalmente utilizado na medicina tradicional para tratamento da malária,
demonstrou possuir propriedades antiplasmodicas equivalentes à cloroquina. A criptolepina parece
exercer as propriedades antiplasmodicas devido à capacidade de inibir a formação da hemozoina, tal como a cloroquina, ligando-se ao heme e bloqueando assim o mecanismo de destoxificação do parasita.
No entanto, a criptolepina é também um agente intercalante de cadeias de ADN ricas em guanina (G) e
citosina (C), e tendo preferência por sequências CC não alternadas. Assim, a criptolepina apresenta
propriedades citotóxicas devido à inibição da topoisomerase II e da síntese do ADN. Estas propriedades
citotóxicas podem também estar na origem da actividade antiplasmódica uma vez que, um estudo de
localização intracelular em eritrócitos infectados com P. falciparum, revelou que o alcalóide se acumula
em estruturas no interior do parasita que poderão corresponder ao núcleo.
Neste trabalho foram sintetizados 25 análogos da criptolepina (3) com cadeias laterais diaminoalquílicas,
na posição C11 do núcleo aromático da indolo[3,2-b]quinolina e avaliados quanto as suas
propriedades antiplasmodicas e citotóxicas em linhas celulares de mamífero. O análogo com uma cadeia
lateral de piperidina (3n), apresentou uma actividade antiplasmódica (IC50) variando entre 23 e 44 nM,
contra diferentes estripes resistentes à cloroquina, e um índice de selectividade de aproximadamente
1400, representando um aumento de cerca de 1000 vezes quando comparado com 1. Os nossos estudos
sugerem que a introdução de cadeias laterais com aminas terminais basicas, apresentando valores de pKa
variando entre 5,2 e 12,5, promove a acumulação dos compostos no interior do vacúolo digestivo do
parasita, em níveis de concentração semelhantes aos da cloroquina. Todos os análogos da criptolepina
sintetizados apresentam a capacidade de formar complexos com o monómero da hematina (FPIX-OH),
com constantes de associação (Kass) variando entre 0,062 e 0,41 x106 M-1, semelhante à constante de
associação determinada para a cloroquina (Kass = 0,085 x106 M-1). Os complexos são estabilizados
maioritariamente através de interacções π-π entre o núcleo aromático da indolo[3,2-b]quinolina e o
núcleo porfirínico da hematina. Estudos de modelação molecular revelaram também que os azotos
protonados nas aminas terminais das cadeias laterais podem formar pontes de hidrogénio com os iões
carboxilato da hematina. Estes resultados demonstraram que os novos análogos da criptolepina
apresentam a capacidade de complexar com a FPIX-OH e inibir a formação da hemozoina. No entanto,
o estudo de localização intracelular realizado por microscopia de fluorescência em eritrócitos infectados
com P. falciparum, demonstrou que os análogos da criptolepina também apresentam a capacidade de se
acumularem no núcleo do parasita e assim, potenciar a actividade antiplasmódica. De modo a avaliar a
capacidade de 3 para interagir com estruturas de ADN, foram realizados estudos de interacção com um
oligonucleótido de cadeia única d(5’-GCCAAACACAGAATCG-3’) e de cadeia dupla
d(GATCCTAGGATC)2. Os compostos 3 apresentaram forte capacidade de complexação com ambas as
estruturas de DNA e valores de constante de associação (Kass) variando entre 105 M-1 e 107 M-1. Estudos
de modelação molecular com estruturas de ADN de hélice duplas semelhante à utilizada no ensaios in
vitro, demonstraram que os compostos não são agentes intercalantes, tal como verificado para a
criptolepina, mas ligam-se à fenda menor/maior, com uma estequiometria 2:1 (análogo da
criptolepina:ADN) e interagem preferencialmente com a cadeia de fosfatos através de interacções
electrostáticas e pontes de hidrogénio. Estes resultados demonstraram que a actividade antiplasmódica dos novos análogos da
criptolepina parece ser justificada por efeitos sinérgicos ou aditivos à inibição da formação da
hemozoina e citotoxicidade associada à interacção com estruturas de ADN.
Com o objectivo de aumentar a diversidade de esqueletos químicos com actividade antimalárica,
foram sintetizados novos análogos da indolo[3,2-b]quinolin-11-ona (11-quindolona), tendo como
propósito aumentar a retenção destes compostos no interior do vacúolo digestivo do parasita. Para tal,
foram introduzidas duas cadeias amino-alquílicas (N,N-dietiletanoamina) no núcleo aromático da
quindolona (alquilação em N5 e N10). A reacção originou no entanto padrões de alquilação adicionais,
N,O- (94) e O- (95), que foram também avaliados quanto ao seu potencial antiplasmódico e
citotoxicidade em células hepáticas HepG2 A16. Com introdução de uma ou duas cadeias aminoalquílicas
e átomos de cloro no núcleo aromático, as quindolonas (4, 91a e 91b), inicialmente inactivas,
deram origem a compostos com actividade moderada a forte contra a estirpe W2 do P. falciparum
resistente à cloroquina, apresentando valores de IC50 entre 51 e 2638 nM, e com maior selectividade
para o parasita. Todos os análogos da quindolona sintetizados apresentam também a capacidade de
formar complexos com a hematina, com uma estequiometria 1:1 (análogo:FPIX-OH) e constantes de
associação (Kass) que variam entre 0,074 e 0,14 x106 M-1. A estabilidade do complexo é assegurada pela
formação de interacções π-π entre o núcleo aromático e o anel de porfírina da hematina e estudos de
modelação molecular confirmaram a possibilidade de formação de pontes de hidrogénio entre a amina
terminal da cadeia lateral e os aniões carboxilato do dimero da hematina. Estes resultados demonstraram
que a introdução de cadeias amino-alquílicas no núcleo da quindolona origina compostos com boa
actividade antiplasmódica, com aparente capacidade de inibição da formação da hemozoína e
possivelmente com maior capacidade de acumulação no vacúolo digestivo do parasita.
As indolo[3,2-b]quinolinas demonstraram assim serem bons esqueletos para o desenho e
desenvolvimento de compostos para tratamento da malária, obtendo-se compostos mais activos e
selectivos para o parasita.