Autor(es):
Senos, Jorge
Data: 2008
Identificador Persistente: http://hdl.handle.net/10400.12/207
Origem: Repositório do ISPA - Instituto Universitário
Descrição
A ideia central das teorias contrafactuais de causalidade consiste no argumento
de acordo com o qual afirmações do tipo “o antecedente C causou o resultado E” podem
ser explicadas em termos contrafactuais condicionais do tipo “se C não tivesse ocorrido,
E não teria acontecido”. Esta linha de pensamento, com raízes na definição de
causalidade proposta por David Hume (1748/1910) é central à análise de causalidade
contida na teoria proposta por David Lewis (1973), à qual os desenvolvimentos da
psicologia nesta área muito devem. Menos preocupada acerca do que é uma causa, do
que como é que as pessoas inferem causalidade, a psicologia adoptou, com base no
conceito de simulação mental de mundos alternativos, uma perspectiva contrafactual da
causalidade, sublinhando que o pensamento contrafactual influencia de duas formas a
produção de conclusões causais acerca dos acontecimentos (e.g. Kahneman & Miller,
1986) e das pessoas (e.g. Lipe, 1991). A primeira fonte de informação resulta de a
reversão contrafactual dos acontecimentos indicar o candidato causal desses
acontecimentos. Quando dizemos que “se tivesse conduzido com menos velocidade o
acidente teria sido evitado”, revertendo mentalmente este acontecimento através da
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remoção contrafactual do excesso de velocidade, indicamos que a causa desse acidente
foi o excesso de velocidade. Uma segunda fonte de informação para a conclusão causal,
resulta de o pensamento contrafactual se constituir como um teste de verdade causal. Se
a remoção contrafactual de um antecedente não for capaz de reverter um acontecimento,
estamos na presença de uma co-ocorrência e não de uma relação causal. Pelo contrário,
se a remoção contrafactual de um antecedente se mostrar eficaz na remoção do
acontecimento, então a relação estabelecida entre o antecedente e o acontecimento, é de
natureza causal.
Esta linha teórica encontrou, na psicologia, suporte experimental através dos
estudos de Wells e Gavanski (1989), ao demonstrarem experimentalmente que as
pessoas consideram mais causal o antecedente que mudam contrafactualmente no
sentido de reverter os acontecimentos, revelando uma convergência de enfoque entre o
pensamento contrafactual e a explicação causal sobre um mesmo antecedente.
Adicionalmente, Roese & Olson (1997), usando um paradigma experimental de
facilitação, demonstraram que a realização de uma tarefa contrafactual facilita a
posterior inferência causal, reduzindo significativamente os tempos de latência
necessários à conclusão causal.
Todavia, esta posição teórica, apoiada nos resultados encontrados
experimentalmente, não ficou isenta de controvérsia, tendo sido desafiada pelos
resultados experimentais que demonstram a existência de dissociação de enfoque entre
os dois processos. N’Gbala e Branscombe (1995) encontraram evidência experimental
de que o pensamento contrafactual se centra em condições necessárias para a ocorrência
dos acontecimentos, enquanto a causalidade se centra em antecedentes suficientes. Por
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seu lado, Mandel e Lehman (1996) vieram demonstrar que o pensamento contrafactual
se centra em antecedentes controláveis, enquanto a explicação causal se centra em
antecedentes que covariam com o resultado.
Adicionalmente, N’Gbala e Branscombe (2003) argumentando que o
pensamento contrafactual requer a existência de conhecimento causal prévio ao
pensamento contrafactual, estabeleceram uma inversão da noção de dependência entre
os dois processos, suportada por resultados experimentais que demonstram que a
realização prévia de tarefas causais facilita a realização posterior de tarefas
contrafactuais, mas não o contrário.
Estas inconsistências experimentais são explicadas com recurso a diferentes
posições teóricas que defendem dependência contrafactual da causalidade, num caso, e
dependência causal do pensamento contrafactual, no outro.
O presente trabalho, situa-se no quadro deste conflito teórico e empírico sobre a
natureza da relação estabelecida entre o pensamento contrafactual e o raciocínio causal.
Ao longo de um programa de investigação contendo seis experiências, foi
produzida evidência empírica que permite concluir que: a) o pensamento contrafactual e
o raciocínio causal se encontram igualmente acessíveis, desafiando o conceito de
precedência de uma tarefa sobre a outra com base no conceito de diferente nível de
complexidade; b) a realização prévia de uma tarefa facilita a realização posterior da
outra, com igual magnitude, estabelecendo um efeito de facilitação simétrica,
contrariando assim anterior evidência experimental que sustenta efeitos de facilitação
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assimétrica de um processo sobre o outro, mas não o inverso; c) o enfoque produzido
pelos dois processos sobre os antecedentes dos acontecimentos não qualifica este efeito
c) ambos os processos requerem e ancoram num mesmo contexto causal mas não um no
outro.
A integração geral dos resultados é feita com recurso à proposta de um modelo
de integração entre o pensamento contrafactual e a inferência causal que, explicando o
padrão de resultados encontrados, permite igualmente harmonizar diferentes
perspectivas teóricas.